“Somos feitos de histórias”, afirmou o escritor uruguaio Eduardo Galeano, numa referência ao fato de que elas nos definem como humanidade e revelam quem somos. Todos nós contamos, vivemos e apreciamos boas histórias o tempo todo. E é fato que marcas que criam e contam histórias são muito mais apreciadas do que aquelas que não utilizam esse meio. Grandes estúdios de cinema como a Pixar e a Marvel estão aí para nos convencer disso!
Ainda que as histórias estejam presentes em aspectos cotidianos de nossas vidas, criar uma história relacionada a um design, produto, marca ou empresa não é algo simples ou natural. Para desenvolver uma estratégia que guie o usuário ao longo de uma jornada transformadora é preciso explorar as conexões entre design e storytelling.
Numa tradução literal, storytelling significa o ato de contar histórias. Na prática, essa definição tem por objetivo comunicar uma ideia, por meio de uma narrativa com começo, meio e fim, utilizando recursos visuais ou multissensoriais. A expressão “telling” seria a forma que você vai utilizar para contar sua “story”, que é a essência.
O tema virou tendência há alguns anos passando por diferentes áreas, como a publicidade, o marketing, a psicologia, a neurociência, o cinema e a inovação. Portanto, existem diferentes formas de se abordar o tema.
Muitos profissionais consideram o storytelling como uma ferramenta ou uma técnica para criar uma boa campanha de comunicação ou desenvolver gatilhos mentais para atrair as pessoas e mantê-las engajadas. Mas vamos um pouco além!
Nesta série de artigos, abordaremos como utilizamos o storytelling como um método aplicável dentro de uma metodologia de design estratégico. Em nosso processo de criação de marcas, por exemplo, o intuito é transformar elementos da história da marca num verdadeiro universo criativo.
Toda marca, empresa ou profissional possui uma história. Mas não adianta criar uma boa história sem ter um bom produto ou oferecer um bom serviço. Não é apenas sobre resultados. É sobre propósito e experiência! Pessoas se conectam com aquilo que elas identificam.
Uma boa história tem o poder de influenciar comportamentos. Porém, ela deve fazer parte da cultura da marca e não ser apenas seguir uma tendência de momento. A história é o que cria conexão, credibilidade e humanização.
E como criar uma narrativa em um processo de design?
O design como storytelling é um método que se vale de narrativas, elementos ou recursos visuais para transmitir um conceito, construir uma identidade de marca ou criar uma jornada de experiência para o usuário.
A estrutura mais clássica de uma história segue um arco narrativo de 5 partes: exposição (cenário e apresentação), aumento da ação (conflito, um problema), ponto mais alto ou clímax (resolvendo o conflito), declínio da ação (que leva à solução do problema) e resultado (experiência obtida com a ação).
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Para Ellen Lupton, a ação move as histórias e também o processo de design. Por isso que o design, além da solução de problemas, busca encontrar a melhor experiência na solução daquele problema. Assim como uma história envolvente, um produto, imagem ou local bem projetado ajudam a criar memórias e estabelecer conexões.
Outra estrutura presente nas histórias é a jornada do herói, baseada nos estudos de Joseph Campbell sobre a estrutura narrativa dos mitos (O herói de mil faces, 1949), posteriormente adaptada por Christopher Vogler, na obra A Jornada do Escritor (2006). Em síntese, a jornada do herói segue um ciclo que envolve um personagem, um chamado à aventura, o auxílio de um guia, os desafios e conflitos num mundo novo e estranho onde a história se desenrola até seu desfecho.
O mais importante ao buscar conectar a jornada do herói em uma narrativa para uma marca não é segui-la passo a passo, e sim compreender seu funcionamento para aplicá-la na prática, criando ações que guiem os usuários e sua experiência com a marca.
“Para explorar a relação do design e a experiência do usuário, seja com produtos ou serviços, é preciso planejar as estruturas. Ferramentas como o arco narrativo, a jornada do heroi, o planejamento de cenários e o design ficcional, podem ser utilizadas para compreender contextos, analisar situações, expectativas, pensar a frente e prever possíveis futuros.” (Lupton, 2020)
Mas como projetamos histórias para uma ótima experiência do usuário?
As decisões que tomamos ao criar objetos tangíveis ou experiências imersivas podem ter um arco narrativo. O design dá apoio aos objetivos e intenções dos usuários, seja na criação de um produto, uma linguagem visual, no planejamento de um cenário ou layout de um espaço físico, ou ainda na usabilidade de um sistema.
“As emoções afetam o design de qualquer coisa, desde a fonte de um logotipo até o aplicativo de um banco. O sucesso de um produto ou serviço depende das conexões com a jornada do usuário. Design emocional é experiência. Ele nos convida a pensar como os usuários irão vivê-la e lembrá-la depois. Para criar essas soluções e construir empatia, a co-criação é uma etapa importante em um projeto de design.” (Lupton, 2020)
Para Lupton, o processo criativo do design atua como uma narrativa, pode afetar as emoções das pessoas, influenciar suas decisões e moldar a percepção de um produto ou serviço. Por isso os princípios de função e forma convivem num projeto de design todo o tempo, e vai muito além da estética.
“O design usa forma, cor, materiais, linguagem e pensamento sistêmico para transformar o significado de tudo… O design incorpora valores e ilustra ideias. Ele deleita, surpreende e nos leva a agir. (…) As histórias também fazem isso. (…) O design como storytelling é um guia para a ação criativa.” (Lupton, 2020)
Designers são responsáveis por desenvolver pontos de contato que devem traduzir, através de aspectos visuais, os valores presentes na narrativa contada pela marca, para estabelecer uma conexão emocional com o seu público de interesse.
“Toda sensação envolve ação e interação. Um produto ganha vida à medida em que as pessoas o consomem ao longo do tempo. O mesmo vale para uma marca ou um site. Designers usam estímulos para criar elementos visuais e sensoriais. Cores, formas, sons, imagens, palavras, sabores… é preciso explorar não apenas o visual mas o design multissensorial.” (Lupton, 2020)
Neste contexto, o design como storytelling se torna um caminho para novos experimentos, já que a nova dimensão do design é a conexão com os sentidos, sua capacidade de provocar emoções e convidar as pessoas a fazerem parte da marca. Esse processo pode guiar as pessoas numa direção, mas cada uma vai trilhar sua experiência.
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